É mentira que o Banco Central seja independente. Ele está atrelado, hoje, aos interesses dos banqueiros e rentistas que vivem de juros
Após sete anos de um golpe de Estado, que derrubou a presidenta Dilma, podemos avaliar com mais clareza as consequências desse processo constituído sob o programa “Ponte Para o Futuro” de Michel Temer, que propunha as mais diversas privatizações e retiradas de direito, visando apenas o ganho de uma pequena parcela da sociedade brasileira, que vive da exploração do trabalho alheio. A eleição de Jair Bolsonaro em 2018, com Lula preso injustamente, coloca os militares em cena, garantindo os avanços das reformas neoliberais restantes. De lá para cá, o trabalho e a aposentadoria foram profundamente prejudicados por esse projeto. Hoje, trabalhamos mais para ganhar menos, e com direito a aposentadoria restringido.
Como se esse cenário de crise social e econômica não fosse o suficiente, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, declarado independente por Jair Bolsonaro por pressão dos banqueiros, mantém há meses a Selic – taxa básica de juros – a 13,75% ao ano, a segunda maior taxa de juros no mundo. Isso significa que a cada compra parcelada, esse percentual será cobrado, além do pagamento de empréstimos e transações financeiras.
Como consequência, no âmbito pessoal, os juros altos impedem que as famílias comprem seus bens parcelados, bem como peçam crédito para financiamento e, no caso de quem já tinha dívidas, tenha mais dificuldade de pagá-las.
No âmbito social, os juros altos reduzem a possibilidade no investimento na produção e no desenvolvimento econômico, o que não gera empregos. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), 71% das empresas apontam que a taxa Selic é o principal impeditivo para ter acesso a crédito.
Por isso, prejudica não apenas o cotidiano das famílias brasileiras que querem melhorar suas vidas com bens de consumo, mas também quem é comprometido com um projeto de desenvolvimento para o país, que envolve investimento na produção, nos mantendo dependentes da lógica da especulação financeira.
E mesmo não querendo investir ou financiar, o povo brasileiro também paga a conta, pois ao subir a taxa Selic, a dívida pública passou de 2% para 10% do PIB, que corresponde a 920 bilhões por ano, pagos aos bancos, que ficam com 53,6% desse valor, segundo a economista Mônica de Bolle, da Universidade de Johns Hopkins nos EUA.
A justificativa do Banco Central para a taxa abusiva é de que os juros precisam ficar altos para controlar a inflação – nível geral dos preços de bens e serviços -, que sobe quando a população compra mais do que é produzido, e quando os juros estão altos as pessoas compram menos, desacelerando a economia e reduzindo o preço geral pela diminuição da demanda. Porém, no caso do Brasil, o consumo já estava em queda, como mostra o IPCA, que soma 3,16% em 12 meses, ou seja, é o menor índice de inflação dos últimos três anos, combinado aos recordes de endividamento das famílias, demonstrando que as famílias compraram menos e se endividaram mais no último período. Inclusive, no mês de junho o Brasil teve uma deflação, segundo o IBGE. Ou seja, o argumento do BC não é verdadeiro.
Por isso, é mentira que o Banco Central seja independente. Ele está atrelado, hoje, aos interesses dos banqueiros e rentistas que vivem de juros. Enquanto isso, a classe trabalhadora brasileira segue com menos direitos sociais, menos empregos e menos possibilidade de acesso a bens de consumo.
Para reconstruir o Brasil, o governo Lula deve enfrentar o setor financeiro com firmeza, investindo no desenvolvimento, para que tenhamos mais emprego, moradia, saúde, educação, comida, transporte e para termos melhores condições de organização e luta contra os juros. Por isso, a CMP, junto aos movimentos populares e sindicais, está participando da campanha pela redução dos juros e pela demissão de Campos Neto, porque estamos verdadeiramente comprometidos com um projeto de sociedade que defende os interesses do povo, que segue sendo roubado por seus patrões.
www.brasilpopular.com/Por Raimundo Bonfim, advogado, coordenador nacional da Central de Movimentos Populares (CMP) e membro da coordenação nacional da Frente Brasil Popular (FBP). Iniciou a militância nos movimentos populares em 1986, na Favela Heliópolis, a maior de São Paulo