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/ sexta-feira, novembro 22, 2024
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Pandemia e preço do combustível impactam modelo de transporte público e país já soma 483 greves

Usuários sofrem com crise no transporte público iniciada em 2020 - Toninho Tavares/Agência Brasília
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Motoristas e cobradores pressionam empresas, que se dizem em crise e pedem subsídio para governos

Se você teve algum problema para conseguir pegar um ônibus na sua cidade nos últimos três anos, saiba que não está sozinho. Desde 2020, o serviço de transporte público no Brasil enfrenta uma crise sem precedentes – e quem precisa se deslocar a trabalho ou para compromissos está entre os maiores prejudicados.

Essa crise é causada pela queda do número de passageiros ligada principalmente à pandemia e também pelo aumento do óleo diesel, cujo preço quase dobrou desde o início do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), em janeiro de 2019.

Por conta dela, mais 49 empresas de ônibus país afora interromperam seus serviços, segundo a Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU). Já segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), houve 484 greves ou paralisações de trabalhadores do setor motivadas por direitos trabalhistas.

Só neste ano, 17 das 27 capitais do país enfrentaram greves. São elas: Aracaju (SE), Belém (PA), Belo Horizonte (MG), Campo Grande (MS), Fortaleza (CE), Florianópolis (SC), João Pessoa (PB), Maceió (AL), Manaus (AM), Macapá (AP), Natal (RN), Rio Branco (AC), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), São Luís (MA), São Paulo (SP) e Teresina (PI).

“Essas mobilizações em época de negociações salariais ocorrem naturalmente, mas elas vêm persistindo todo ano”, afirmou Paulo João Estausia, o Paulinho, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte e Logística (CNTTL) e do Sindicato dos Rodoviários de Sorocaba. “Por alto, posso te dizer que elas aumentaram uns 40%.”

Recuperação de direitos

Segundo Paulinho, as greves e paralisações são necessárias para que trabalhadores reconquistem direitos perdidos durante a pandemia. Segundo ele, como o período de isolamento social reduziu a demanda por transporte público, muitas companhias acabaram reduzindo a carga horário de funcionários e, com isso, o salário.

Hoje, porém, o isolamento acabou. Os ônibus voltaram a circular, mas Paulinho disse que nem tudo que era pago a motoristas e cobradores voltou.

Em São Paulo, por exemplo, trabalhadores do transporte público cruzaram os braços em junho para recuperar direitos. A greve reduziu a circulação de ônibus, fechou terminais de integração e forçou a prefeitura a suspender o rodízio de automóveis.

Nailton Francisco de Souza, diretor executivo do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo (Sindmotoristas), explicou na época que, na pandemia, a categoria perdeu o direito ao intervalo remunerado de 30 minutos para almoço. Após o fim do isolamento, empresas se negaram a retomar a jornada anterior. Segundo ele, isso reduz salários de motoristas em até R$ 600 e de cobradores em R$ 400.

Francisco Christovam, presidente da NTU, explicou que parte das reivindicações de funcionários não é atendida porque muitas empresas de transporte estão à beira da falência. Segundo estimativas dele, existiam cerca de 1.800 empresas de ônibus antes da pandemia. Destas, cerca de 220 fecharam as portas ou foram vendidas e pelo menos outras 16 entraram em processo de recuperação judicial – estágio em que uma empresa recorre à Justiça para tentar renegociar suas dívidas.

“O empresário quer pagar tudo, recolher o previsto na CLT [Consolidação das Leis do Trabalho], mas a situação está insustentável”, disse Christovam. “Já sofríamos com a concorrência dos aplicativos. Depois veio a pandemia e agora o aumento do preço do combustível.”

“Conta não fecha”

Christovam explicou que, na pandemia, o volume de passageiros transportados por ônibus caiu 80% e afetou a receita das empresas. Com o fim do isolamento, a busca pelo transporte aumentou, mas ainda está 20% abaixo do que era e não deve crescer mais, já que muita gente passou a trabalhar e estudar de casa.

Fora isso, o preço do diesel praticamente dobrou. Durante o isolamento, o litro do combustível custava R$ 3,80. Hoje, custa quase R$ 7,50.

Christovam afirmou que esse diesel representa 30% do custo das empresas, que é geralmente coberto pela receita das passagens do ônibus.

Fazendo uma conta simples, se antes da pandemia uma passagem custava R$ 3, R$ 1 era referente ao diesel. Se o preço do diesel dobrou, as contas da NTU indicam que essa passagem deveria subir R$ 1. Esse aumento seria de 33%, índice que nenhum prefeito tem condições políticas de anunciar, principalmente num ano eleitoral.

A falta de passageiros e a alta dos custos causaram prejuízos de R$ 25,7 bilhões a empresas de transporte, de 2020 a 2022, de acordo com a NTU. Só não foi maior, segundo Christovam, porque as prefeituras entenderam a gravidade da situação e passaram a subsidiar com recursos públicos o funcionamento do transporte público.

“Antes da pandemia, São Paulo, Curitiba e Brasília subsidiavam o transporte. Hoje, são mais de 250 cidades Brasil afora. Eles entenderam que só o pago pelo usuário não mantém o sistema”, afirmou.

Vai melhorar?

Christovam, inclusive, disse que o subsídio do poder público deverá se tornar prática padrão em todas as cidades do país. Segundo ele, essa é a única forma de os municípios manterem o serviço público funcionando com menos passageiros e combustível caro.

Nisso, aliás, empresários e trabalhadores concordam. Segundo o sindicalista Paulinho, a decadência econômica brasileira atingiu de forma especial o transporte público.

Para ele, se o país não gerar empregos, dinamizar sua economia e mudar a política de preços da Petrobras, a tendência é que os problemas persistam. As consequências devem, por fim, onerar os cofres públicos, os trabalhadores e os usuários.

“Essa questão do diesel acompanhar o preço do dólar não funciona”, afirmou. “Enquanto o país não rever a os encaminhamento da economia, nós vamos passar por essa situação, e ela tende a piorar.”

www.brasildefato.com.br/Vinicius Konchinski

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