Relatório epidemiológico diz que cerca de 20% da população da capital já teve covid
Ninguém quer pegar o coronavírus, mas um estudo apontou que 20% da população de Salvador já contraiu vírus, e muita gente nem soube. O relatório epidemiológico foi pedido pela prefeitura à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e os resultados da primeira fase foram publicados nesta segunda-feira (25).
“Desde o início da pandemia sentíamos a necessidade de ter um dado sobre a quantidade de pessoas que já havia contraído o vírus em nossa cidade. A gente se baseia na ocupação de leitos e no número de óbitos diários [para tomada de decisões]. Sempre que a gente ampliava o número de testes aumentava o número de infectados, mas a gente ainda não tinha uma amostragem da cidade toda, um estudo que poderia estimar pessoas já tinha contraído o vírus ”, contou.
Uma parceria com a Fiocruz surgiu nesse sentido. Segundo o prefeito, através da análise desses dados será possível identificar qual parte da população está imunizada, ainda que provisoriamente, e quais decisões serão processadas. O estudo é dividido em fases, e vai avaliar a capacidade de resposta dos problemas à doença.
A Bairros A pesquisa também conseguiu identificar os bairros onde uma população foi mais infectada. Os distritos sanitários de Itapagipe e Liberdade lideram o ranking. Segundo o estudo, 29% dos moradores de cada uma dessas regiões já tiveram uma doença, com sintomas ou não. Em seguida aparece São Caetano (26%), Cajazeiras (25%) e Itapuã (22%). Confira a tabela completa abaixo.
Itapagipe e Liberdade lideram ranking de casos de coronavírus em Salvador (Foto: Arisson Marinho / CORREIO) |
Nos distritos líderes, o movimento de pessoas nas ruas é intenso e muitas delas não usam uma máscara correta ou nem mesmo a levam consigo. O cenário em plena segunda-feira parece na verdade de final de semana, mas o comércio a pleno vapor confirma os dados. Na porta das casas e nos bares, pessoas sentadas em mesas bebendo cerveja.
Nas praças, meninos jogando futebol e mais pessoas reunidas sem máscara. Até mesmo comerciantes não utilizam o equipamento de segurança corretamente. Além disso, outros locais de aglomeração são os pontos de ônibus, que estavam lotados, e o sol do meio de tarde fazia as pessoas se apertarem ainda mais na disputa por sombra.
Na Ribeira, Praia da Penha cheia. Muitas pessoas em quiosques da beira mar e também na areia. Reunião para piquenique na sombra, vôlei de praia, som tocando. Mas, segundo uma vendedora de caldo de cana, moradora do bairro, o movimento ainda estava fraco para o que era normalmente antes da pandemia. Dona Conceição da Silva, de 59 anos, contou que viu a filha e também vizinhos atravessarem a doença. “Antes o pessoal estava mais em casa, mas as pessoas têm que sair, até mesmo para trabalhar, aí os ônibus estão lotados. Eu tenho medo, porque ninguém está livre. É uma doença que todo mundo sabe que está matando. Mas tenho que trabalhar, né?”, disse a ambulante.
O oficial de manutenção e morador de Caminho de Areia Sílvio Oliveira, de 50 anos, estava comendo caranguejo em um bar e relatou ao CORREIO que vários vizinhos foram infectados e ele mesmo já teve a covid-19. “Na virada do ano eu estava isolado de covid. Eu, minha mãe de 84 anos, minhas irmãs e minhas sobrinhas. Foi quase a família toda. Eu devo ter pego no trabalho, que teve muitos casos, e levado para dentro de casa, porque na verdade eu nunca gostei de usar máscara”, confessou.
29% dos moradores de Itapagipe já tiveram a doença (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) |
Barraqueiro há mais de 40 anos, Seu Antônio Luiz, de 63 anos, está na região quase todos os dias da semana e contou que é na Praia do Bugari onde acontecem as maiores aglomerações, inclusive com festas paredão. Ele relatou que também conhece pessoas que foram infectadas. “Lá no Bugari fica uma multidão, a faixa de areia é mais curta e ninguém vai atrás, não faz nada. Conheço moradores daqui que já tiveram a doença e até mesmo faleceram. São amigos, conhecidos, comerciantes também. Teve uma família que perdeu dois irmãos”.
Na Liberdade, movimento também intenso, principalmente do comércio de rua. Segundo uma moradora do bairro que preferiu não se identificar, a circulação na região está igual a como era antes da pandemia. “As pessoas parecem não acreditar na doença. E agora então que chegou a vacina, o pessoal está achando que já acabou o coronavírus. Muita gente sem máscara, bares cheios, tanto dia de semana quanto final de semana. Aqui não tem dia”, disse a moradora.
No estabelecimento em que trabalha, uma faixa para impedir a aproximação dos clientes do balcão e placas nas paredes avisando que só será atendido quem estiver de máscara. Mas, segundo a moradora, nem todo mundo respeita. “Eu tenho medo sim. Por isso coloquei a faixa e os avisos. Mas muita gente chega aqui sem máscara e nem sempre eles atendem quando a gente pede para colocar”, relatou.
(Foto: Arisson Marinho/CORREIO) |
A dona de casa Iolanda Assis, 56 anos, mora no bairro de Paripe, no Subúrbio Ferroviário. A região é a menos infectada até o momento. “Eu fico até surpresa em saber disso porque nem todo mundo está respeitando o isolamento. Tem muita gente se aglomerando sem necessidade, mas na rua onde moro tem muita gente consciente também”, contou.
Para o prefeito o fato dos números estarem baixos no Subúrbio não é motivo para comemorar. Ele voltou a frisar sobre a necessidade de evitar aglomerações, usar máscara, e higienizar as mãos com frequência, seja com álcool em gel ou com água e sabão.
“No Subúrbio 9% da população contraiu o coronavírus, ou seja, 91% das pessoas ainda não foram infectadas. Esse é um número preocupante tendo em vista que o Subúrbio é uma região que tem a concentração populacional maior, com maior número de habitantes por casa, e onde as casas estão mais próximas umas das outras, ou seja, uma região mais difícil de fazer o isolamento social”, contou.
Metodologia
O relatório foi construído através de uma parceria entre a prefeitura e a Fundação Oswaldo Cruz. O Município forneceu pessoal, veículos, e testes para covid, entre outros recursos, enquanto a Fiocruz entrou com a análise dos dados colhidos, e com suporte técnico e científico.
O estudo tem quatro objetivos. Estimar a quantidade de soteropolitanos com anticorpos para o vírus, avaliar a duração dos anticorpos nessas pessoas, determinar o percentual de assintomáticos ou subclínicas, e analisar os aspectos sociodemográficos da doença.
Na prática, os pesquisadores vão acompanhar para saber por quanto tempo uma pessoa terá o IgG positivo, e para isso o estudo foi dividido em quatro etapas. Na primeira fase os intervalos entre os testes serão de 30 dias. O primeiro foi apresentado nesta segunda-feira (25). Haverá outros três. Já na segunda fase os intervalos serão de 180 dias.
Confira o ranking das regiões mais infectadas de Salvador:
Itapagipe (29%)
Liberdade (29%)
São Caetano (26%)
Cajazeiras (25%)
Itapuã (22%)
Boca do Rio (21%)
Cabula (19%)
Pau da Lima (17%)
Brotas (16%)
Centro Histórico (15%)
Barra / Rio Vermelho (12%)
Subúrbio (9%)
www.correio24horas.com.br / Gil Santos. Colaborou Carolina Cerqueir, com orientação da subeditora Monique Lôbo