Governo quer diminuir contribuição do patrão ao FGTS e à Previdência para agradar empresários e fazer Congresso aprovar criação de imposto igual CPMF, que todos pagam. Trabalhador vai perder ainda mais.
O ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, insiste na criação de um novo imposto que incidiria sobre as transações financeiras, semelhante a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), criada em 1997 no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e extinta em 2007, no governo de Dilma Rousseff (PT).
Para vencer as resistências dos empresários e de setores do Congresso Nacional e aprovar o Imposto sobre Transação Financeira (ITF), Guedes acena com mais benefícios para os patrões, o que, em geral, significa prejuízo para a classe trabalhadora, e claro, diz que a medida vai gerar emprego. Só não diz como.
Para aprovar o novo imposto, o governo prepara uma bela contrapartida para os patrões, a desoneração da folha salarial. E isso será feito mexendo no bolso do trabalhador. Guedes sugere diminuir de 8% para 6% a contribuição dos empresários no valor do depósito do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que segundo o jornal Folha de São Paulo, retiraria R$ 32 bilhões por ano dos trabalhadores com carteira assinada.
E tem mais beneficio para o empresariado. Guedes também quer diminuir de 20% para 15% a alíquota de contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e outro percentual ainda não divulgado sobre a contribuição ao Sistema S. Com todas essas reduções, os impostos sobre a folha de pagamento cairia de 20% para 10%. ´
Tudo isso para aprovar a nova CPMF ou o ITF cuja alíquota – de 0,2% a 0,4% – incidirá sobre todas as transações digitais, bancárias, inclusive de aplicativos de transporte e de entrega de comida, entre outros. Ou seja, o novo imposto vai taxar a todos e os pobres como sempre serão os mais tributados, apesar do discurso oficial garantir que pobre não será prejudicado. Mais uma injustiça tributária.
“De um lado você tem muita gente que usa os bancos e o sistema financeiro não pagando nada, mas se a proposta viesse acompanhada de reforma Tributária e não de desoneração da folha de pagamentos que retira ganhos do trabalhador, o novo imposto seria mais justo”, avalia o economista e presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann.
Pagando menos impostos, as empresas vão contratar mais, diz Guedes. Experiências passadas mostraram que isso não é verdade. Diversos economistas ouvidos pelo Portal CUT afirmam que o que gera emprego e renda são os investimentos do Estado e não a iniciativa privada, já que sem demanda as empresas não vão contratar.
Corta FGTS é cortar salário
Essas reduções que o governo diz que vai gerar emprego e renda, na verdade, para variar, vão recair negativamente sobre o rendimento do trabalhador, avalia a técnica do Dieese/ subseção CUT, Adriana Marcolino.
“O Fundo de Garantia não é tributo, é salário indireto. Reduzir o valor do seu depósito é reduzir a renda do trabalhador. Além disso, o FGTS financia políticas públicas relevantes, como saneamento e habitação, que se mostraram pontos frágeis nesta pandemia do coronavírus. Se o governo esvaziar o Fundo como essas políticas serão financiadas?”, questiona Adriana.
Cortar FGTS é cortar salário, já que em algum momento o trabalhador vai precisar utilizar o dinheiro depositado na sua conta
Proposta desonera folha e reduz arrecadação
Outra crítica feita pelo economista Marcio Pochmann é que a proposta do governo reduz o pagamento de tributos sobre folha de pagamentos sem resolver a questão da queda da arrecadação, pois “ao desonerar a folha de pagamentos você reduz a arrecadação do Estado que financia serviços públicos”.
“Parte do que é pago na folha salarial financia o salário educação e o Incra, por exemplo, enquanto o Sistema S é responsável por parte da formação dos trabalhadores”, diz.
Previdência pública, mais um problema
A redução no financiamento da Previdência pública é outro ponto da proposta de Guedes que preocupa a técnica do Dieese, que lembra a brutal reforma da Previdência feita no ano passado, que reduziu valores e benefícios dos trabalhadores alegando falta de dinheiro e reduziu o que está entrando no caixa do INSS.
“Creio que a intenção do governo é caminhar para uma Previdência financiada exclusivamente pelo trabalhador, a chamada capitalização, em que somente o trabalhador paga por sua aposentadoria, destruindo o tripé que hoje é composto por Estado, empresas e trabalhador”, critica.
A conta da fatura total de medidas de compensação à recriação da CPMF seria de R$ 127 bilhões. Pelas contas do governo, segundo o jornal o Estado de São Paulo, uma nova contribuição com alíquota de 0,2% cobrada tanto no crédito (entrada dos recursos na conta) como no débito (qualquer retirada de recursos) pode arrecadar R$ 125 bilhões. Como todas as desonerações custariam mais do que a arrecadação, o governo já acena com uma alíquota de até 0,4%.
O problema da proposta do governo, segundo a técnica do Dieese, é que ele não é progressivo e nem tem um destino certo como a extinta CPFM, destinado à saúde.
“É preciso que se façam algumas faixas de isenção e cobrança porque as transações digitais precisam ser melhor tributadas e as transações financeiras também. Isso no entanto, não deveria significar aumento de tributos no consumo”, diz Adriana.
Já para Pochmann, se não tiver outro mecanismo o país vai ter um problema maior de financiamento.
“O Estado precisa pagar a Previdência, a educação e até gerar emprego e renda, mas com ganhos menores do trabalhador, o consumo será menor e a roda da economia não gira”, acredita.
Governo tenta ganhar apoio da classe alta e média com menos IRPF
Sabendo que o novo imposto não agrada nem aos pobres, nem a classe média e alta, o governo, também pela imprensa, diz que poderá diminuir as faixas de cobrança do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), cuja faixa maior é de 27,5%. A informação é que esta faixa caia para algo em torno de 25% a 23%. No entanto, cairiam as isenções sobre gastos com saúde, entre outros.
Mas, segundo Pochmann, esta redução na alíquota do IRPF vai aliviar ainda mais a camada de cima, os que têm mais renda.
“Nos anos de 1990, no governo Collor de Mello [PTC-AL] a alíquota chegava a 45%. O alívio para hoje de 27,5% não resolveu o problema da tributação aos mais pobres que é a camada da população que indiretamente acaba pagando mais imposto. Mas, neste caso sou a favor de diminuir determinadas isenções como os gastos com a saúde privada porque o Estado financia a saúde pública, o SUS, e também a saúde e educação particulares com o abatimento desses pagamentos no imposto de renda”, afirma o presidente da Fundação Perseu Abramo.
A atualização de alíquotas maiores para salários maiores é defendida pela técnica do Dieese. Para Adriana Marcolino, as faixas de imposto deveriam atualizar a incidência sobre a renda.
“O imposto de renda é o mais justo porque cobra direito do rendimento das pessoas, mas é preciso que haja mais faixas de isenções e aumento de alíquota nas faixas de quem ganha mais”, diz.
Déficit público aumenta no governo Bolsonaro
Contrariando o discurso neoliberal do próprio governo que acusa o Estado de ser gigante, deficitário e tomado por parasitas, a gestão de Jair Bolsonaro (ex-PSL) está conduzindo o país ao maior déficit público da história, segundo Pochmann.
O economista diz que neste primeiro trimestre de 2020 em relação ao mesmo período aumentaram de 40% para 50% do Produto Interno Bruto (PIB) as despesas do governo.
“É a contradição entre o discurso e a realidade. Temos uma carga tributária em torno de 34% do PIB e um déficit público de 16%. O governo aumentou suas despesas para manter o Estado”, diz.
O problema, segundo Pochmann, é que a arrecadação do governo federal caiu 30%. Então o discurso neoliberal de que o Estado é improdutivo e que é o mercado privado que aquece a economia não se concretiza. O governo faz um monte de concessões, mas de fato a economia não cresceu, por, entre outros motivos, falta de arrecadação.
O déficit público será cavalar. Teremos a maior dívida histórica em relação ao PIB neste ano. É um governo sem compromisso. Nunca a administração pública foi tão mal gerida
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