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/ sexta-feira, novembro 22, 2024
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Por que a existência de bilionários é um risco para a democracia

Falta de saneamento básico no Brasil - Desigualdade social. Créditos: Marianne Ortelli/Wikimedia Commons
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Em entrevista à Fórum, coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil comenta relatório Desigualdade SA

No começo da semana a Oxfam Brasil publicou o relatório ‘Desigualdade SA – Como o poder corporativo divide o nosso mundo e a necessidade de uma nova era de ação pública’, em que mostra uma série de dados alarmantes sobre os rumos da humanidade sob o capitalismo. A principal revelação é de que, de 2020 para cá, os cinco principais bilionários do mundo dobraram suas riquezas enquanto 60% da população do planeta, ou 5 bilhões de pessoas, empobreceram no mesmo período.

Ao longo do relatório são detalhadas uma série de aspectos desse quadro de desigualdade global. Entre eles a hegemonia do capital financeiro no controle das corporações e o próprio poder dessas corporações que influenciam governos e manobram Estados em todo o mundo para que seus interesses sejam atendidos. Nesse sentido chegam as políticas de austeridade, privatizações, desregulamentação de leis trabalhistas e a forte queda do poder dos salários, enquanto, do outro lado da pirâmide, os principais acionistas das principais corporações dragam a riqueza gerada na produção e nos serviços.

Em dado momento, o relatório fala abertamente que “fica nítido que a propriedade de ações e participações, em termos econômicos, reflete uma plutocracia e não uma democracia”. A palavra em questão, “plutocracia”, significa justamente o ‘governo daqueles que têm grana’.

Nesse sentido, entrevistamos Jefferson Nascimento, coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, para comentar o relatório e nos responder em que medida, exatamente, a mera existência desses bilionários pode produzir uma desigualdade que coloque as democracias em xeque e abram o caminho para que a extrema direita se apresente como alternativa.

Leia a seguir os principais trechos da conversa.

Jefferson Nascimento, coordenador de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil

A existência de bilionários é uma ameaça à democracia?

Essa tem sido, justamente, uma preocupação nossa. Não só da Oxfam no Brasil, como da confederação Oxfam, que fazemos parte, e está presente em 65 países. Dentro desse debate temos tentado colocar essa agenda da necessidade de combater as desigualdades, não apenas por ser a coisa certa a se fazer, mas por uma série de razões.

Tem um argumento de ordem moral, de que a gente não pode ter algumas pessoas com tanto e outras com tão pouco; um de ordem jurídica que, no caso do Brasil, por exemplo, a Constituição prevê que é uma das diretrizes da República reduzir desigualdade; e um de ordem política, no sentido de que, pra onde se olha, e os dados do relatório ressaltam isso, vemos aumento da desigualdade e da concentração de renda. Trata-se de um movimento que não só ele não se abrandou com o contexto da pandemia, como se intensificou no período, assim como agora nesse momento pós-pandêmico. Enquanto isso, no outro extremo da humanidade, vemos os reflexos em mais de 90 % da população.

Quando vemos esse cenário, ele em parte explica o crescimento de candidaturas e de políticos de extrema direita em todo o mundo, embalados por questionamentos da própria estrutura e ordem democrática em diversos países.

Políticas de austeridade

Essa não é uma vinculação nova e o nosso relatório fala um pouco desse contexto econômico no qual o planeta se insere, que teve um momento de auge nos anos 1990, e é marcado pela lógica das políticas de austeridade. Ela impõe ser necessário reduzir o papel do Estado e os investimentos públicos, abrindo espaço para empresas privadas dominarem, inclusive, o fornecimento de serviços públicos.

Há todo um capítulo no relatório falando a respeito disso, de como essa lógica de redução do Estado e presença de atores privados, fornecendo serviços públicos essenciais, fez com que, alguns setores se tornassem monopolistas e como isso tem um impacto significativo. Por exemplo, a partir do momento que os serviços de saúde começam a ser majoritariamente exercidos por atores privados, eles ganham uma capacidade enorme de ditar preços e condições regulatórias no mercado.

Extrema direita

Vimos ao mesmo tempo essa redução do papel do Estado, esse aumento das desigualdades e quem propõe saídas baratas, de alguma maneira, têm sido vários políticos de extrema direita que acabam capitalizando esse contexto de piora da condição de vida pra apontar o dedo pra quem? Para os migrantes, os pobres, os indesejados. Isso de alguma maneira, tendo uma adesão ampla em determinados locais, irá oferecer uma resposta errada pra uma questão presente em grande parte dos países.

Hoje mesmo, uma notícia no jornal que me chamou muita atenção e está extremamente ligada e diretamente ligada a esse debate. Donald Trump venceu a primeira primária republicana nos Estados Unidos com uma margem significativa sobre o segundo colocado. Inclusive repercutiu bastante o discurso que ele fez, falando que o Estados Unidos tá sendo invadido por terroristas, que é algo que não tem nenhum tipo de lastro nos fatos. E segundo matéria da Folha, o apoio a ele cresce em todos os perfis, mas é maior ainda entre os mais pobres.

Temos parcelas grandes da população que são afetadas pelas desigualdades, pela concentração de renda, e enxergam como única alternativa ir no sentido de discursos radicais à extrema direita. Nesse sentido, há riscos mais diretos à democracia.

Poder corporativo

No relatório, a gente menciona o fato dessa dinâmica em que grandes empresas transnacionais que se instalam nos países também se aproveitam desse contexto pautado pela lógica da redução do papel do Estado, de desregulamentação, e acabam explorando ao máximo a sua capacidade de atuar de uma maneira monopolística. Isso está conectado a essa prevalência dos mercados de capitais.

Então esse tipo de atuação, regido por uma lógica de remuneração de acionistas, principalmente de grandes acionistas, independentemente do impacto que esse tipo de atuação tem, irá prever uma maximização do lucro e do crescimento em detrimento de todo o resto.

Veja os principais dados e leia o estudo na íntegra.

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