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/ sexta-feira, novembro 22, 2024
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Setembro Amarelo: jovens e adolescentes enfrentam o transtorno de ansiedade

Ana Cristina Costa lida com a ansiedade desde a infância, quando perdeu o pai(foto: Arquivo pessoal)
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Transtorno de ansiedade é uma realidade enfrentada por muitos adolescentes e jovens. Na escola, na família e nas relações pessoais, a doença pode ser um obstáculo em busca de uma vida com mais qualidade

ansiedade é uma cicatriz que acompanha a vida de muitas pessoas. Independentemente de quando ela surge, seja na infância, seja na adolescência, a doença é capaz de levar muitos jovens a uma vida mais reclusa e de dificuldades, principalmente na escola, na universidade ou em suas relações interpessoais. As crises, conhecidas por provocar falta de respiração, dormência em algumas partes do corpo e taquicardia, tornam-se recorrentes em muitos ambientes, além de acarretarem vários outros problemas sociais.

Segundo estudo feito pela Secretaria do Estado de São Paulo, em parceria com o Instituto Ayrton Senna, casos de ansiedade e depressão aumentaram em 69% nas escolas, corroborando, também, com a volta dos alunos às aulas presenciais — depois do longo período de isolamento por causa da covid-19. O levantamento apontou, ainda, junto a uma professora da rede de ensino paulista, que há casos de crianças que chegam a desmaiar em sala de aula, em razão das fortes crises de ansiedade.

O Psicólogo Aldry Ribeiro, professor do curso de psicologia do Centro Universitário Iesb, explica que, na atual onda de discussão sobre saúde mental, há várias razões que são capazes de desenvolver a doença em adolescentes e jovens. As crises, de acordo com ele, são respostas nas quais muitos não têm ou não percebem ter repertórios — cognitivos, emocionais, relacionais e sociais — para lidar com ambientes com os quais estão sendo expostos. A escola, então, aparece como um desses lugares onde as dificuldades são maiores.

“O aluno está sendo desafiado a novos problemas, a novas situações, aos quais ele precisa responder. São chamados a se posicionar. Se não se sente seguro, se não tem confiança em suas habilidades, este chamado a posicionar-se é percebido como ameaçador, demonstrando suas fragilidades”, comenta. O especialista afirma, ainda, que é importante criar cenários em que o adolescente consiga desenvolver suas habilidades e seja capaz de cuidar de si mesmo — um ambiente acolhedor e seguro, para que suas potencialidades não sejam reprimidas em decorrência de um medo que impeça seu desenvolvimento.

Momentos de incerteza

A transição da adolescência para a vida adulta carrega diversas inseguranças quando se avalia a possibilidade de ter um futuro melhor. Essa problemática, junto à ansiedade, apareceu no final do ensino médio de Danielle Sousa, 23 anos. A jovem, que teve a primeira crise em 2017, conta que a dúvida sobre qual faculdade faria e a dificuldade em lidar com relacionamentos criaram uma pressão pesada demais para ela suportar.

Danielle Sousa teve a primeira crise na adolescência: pressão para escolher uma profissão
Danielle Sousa teve a primeira crise na adolescência: pressão para escolher uma profissão(foto: Arquivo pessoal)

Além disso, a cobrança familiar e a expectativa em cursar algo que pudesse ter um retorno lucrativo acarretaram o agravamento da doença. “O peso de estar na reta final e ainda não ter um norte do que fazer da vida, porque se eu escolhesse errado seria dinheiro jogado fora”, lembra a estudante de publicidade e propaganda.

Na época, ela descreve que toda a situação foi muito assustadora. A desinformação e o pouco que sabia sobre ansiedade complicaram ainda mais as coisas. Depois das primeiras crises, Danielle descreve que as próximas se tornaram mais frequentes. A partir disso, começou a buscar na internet, em amigos próximos e atividades que lhe faziam bem um lugar de refúgio para se abrigar sempre que a ansiedade aparecia. “Tento me cuidar com controle de respiração, mudando o foco dos pensamentos, ouvindo música e até meditando”, detalha.

Hoje, apesar da ansiedade ser uma realidade presente, a esperança por um futuro melhor segue aceso no coração da jovem. Ao retornar ao passado, ela assegura que se tivesse a possibilidade de conversar com a versão de si mesma que estava assustada com o início das crises, diria que é possível ser feliz, e que não precisava carregar o mundo nas costas.

“Ainda me vejo sendo super feliz e estável. Ansiedade nem me vem à mente, mas sei que ela pode estar lá. Mesmo assim, vou estar mais madura e consciente do que posso fazer pra amenizar ou nem permitir que cause novamente. Vão ser tempos diferentes e bem melhores”, acredita Danielle.

Solidão e esperança

Hoje com 19 anos, Beatriz Ferreira faz terapia e toma medicamento para controlar a ansiedade desde os 11
Hoje com 19 anos, Beatriz Ferreira faz terapia e toma medicamento para controlar a ansiedade desde os 11(foto: Arquivo pessoal)

Desde os 11 anos a terapia e os medicamentos para tratar ansiedade são uma rotina para Beatriz Ferreira, 19. Por se cobrar muito na escola, no início da adolescência, viu-se abandonando lugares, pessoas e o cuidado que tinha consigo mesma. A reclusão associada à solidão se tornaram uma parte de quem ela é, mas, também, um lado que vem tentando melhorar e mudar. “Todo dia é um enorme esforço para fazer coisas simples. A ansiedade ainda me impede de fazer muita coisa”, ressalta.

Mesmo que a vida escolar tenha sido, por um bom período, preenchida por crises de ansiedade, chegando a faltar meses de aula, hoje ela se vê melhor e retornando aos poucos para uma história mais parecida com a que ela sempre esperou ter. Ao lado de profissionais, a estudante de letras entendeu que tudo é um processo, e que nunca teve nada de errado com seus sentimentos.

Com o tempo, ela garante que aprendeu a ter paciência, controlar os pensamentos e a doença. Mas, mais do que isso, puxou do lado de dentro uma força de vontade para se comunicar e mudar, tentando transformar suas cicatrizes em algo que realmente valha a pena.

Outros fatores

Além dos ambientes citados acima, questões familiares, sociais e emocionais estão entre os principais motivos no desenvolvimento de ansiedade na vida dos jovens. Na avaliação da psicóloga Ana Paula Irias, a grande necessidade de inclusão e de se sentir parte de um grupo são fatores determinantes na construção da doença. “Isso acontece para diminuir o sentimento de rejeição que pode estar presente em outros âmbitos. Na faculdade, normalmente, a ansiedade se relaciona com o medo das escolhas, a necessidade de suprir as expectativas dos outros e de encaixe profissional e social”, analisa.

Todas essas questões, segundo a especialista, criam estresse e são consideradas uma fonte de alimento para o agravamento das crises de ansiedade. Quando o ambiente familiar também se comporta de maneira negativa na vida do jovem, com a cobrança de resultados, comparação com outros indivíduos ou frustração, os gatilhos tendem a se despertar mais facilmente.

Para que o adolescente e o jovem consigam evitar a evolução da ansiedade, Ana Paula argumenta que a comunicação, seja com familiares, seja na escola, pode ajudar de maneira efetiva. A doença, por vezes, pode se tornar um empecilho na maneira de se viver a vida. Por isso, de acordo com ela, é importante buscar referências, bons hábitos alimentares, dividir experiências e, principalmente, buscar ajuda profissional. “Um psicólogo e um psiquiatra são necessários se a ansiedade estiver causando sintomas físicos e trazendo prejuízos emocionais, psicológicos e sociais”, finaliza.

Ansiedade na infância

Entre os 6 e 7 anos, a morte do pai e outras situações despertaram em Ana Cristina Costa, 19, inúmeros problemas, atrelados, ainda, ao transtorno de ansiedade. Quando era pequena, fez terapia e, logo em seguida, foi encaminhada a um psiquiatra, para que pudesse receber os remédios adequados ao tratamento da doença. Com todas as dificuldades crescendo enquanto ela também crescia, na escola, o cenário não era diferente. As crises eram tão fortes que ela chegava a hiperventilar — situação em que a respiração está acima do normal. Isso, segundo a jovem, acontecia porque ela passou a desenvolver um certo tipo de fobia de cheiros fortes na sala de aula.

“A escola em que eu estudava tinha aquelas janelas de vidro em que a abertura é mínima. Sempre que a minha turma saía da educação física, meus colegas jogavam desodorante dentro da sala do próximo horário. Quando sentia o cheiro de vários desodorantes misturados, eu comecei a ter uma crise ansiosa. Não foi só uma vez, e em todas eu tive crise. Chegou ao ponto de eu ter medo de qualquer coisa com cheiro”, descreve.

Ao se comparar com o começo da doença no passado, a estudante de letras diz estar bem melhor. As crises, atualmente, são mais ocasionais, de acordo com ela. Assim que percebe os sinais, Ana relata que tenta realizar atividades e distrair a mente, fazendo caminhada, natação, ou até mesmo lendo um livro. Hoje, ela acredita que, quando mais nova, poderia ter entendido que tudo bem não estar bem sempre. Não se cobrar de maneira exacerbada e entender a importância de estar perto das pessoas que ama. Para o futuro, ela acredita no poder de realizar seus desejos e descreve: “Eu me vejo fazendo o que sonho e rodeada por aqueles que se importam como eu me sinto”.

www.correiobraziliense.com.br/ Por Eduardo Fernandes, estagiário sob a supervisão de Sibele Negromonte

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