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/ sexta-feira, novembro 22, 2024
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Saiba como jovens trabalhadores da Amazon nos EUA desafiaram empresa com sindicato inédito

Trabalhadores da Amazon celebram criação de sindicato, no dia 1 de ab - ANDREA RENAULT / AFP
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Trabalhadores fizeram história ao ganhar direito de formar o primeiro sindicato na multibilionária empresa estadunidense

Os trabalhadores do depósito JFK8 em Stanten Island, distrito da cidade de Nova Iorque, fizeram história ao ganhar a votação para ser o primeiro sindicato de empregados da Amazon nos Estados Unidos.

Esta conquista representa não só o empenho dos trabalhadores e de seus apoiadores na última semana, durante o processo de votação, como também a motivação mantida pelo sindicato, que desde 2020 trabalha para alcançar esta vitória. Do total de 8 mil trabalhadores dentro do JFK8, 4.785 votaram entre os dias 25 e 30 de março, com o voto positivo representando a clara maioria.

Essa conquista não apenas tem grandes implicações para o sucesso dos esforços de organização em outras instalações da Amazon em todo o país, como certamente inspirará trabalhadores de outras grandes corporações a organizar seus locais de trabalho e reconstruir o poder da classe trabalhadora.

Os lucros e a exploração da Amazon

A Amazon é uma das maiores empresas do mundo. Sua receita global foi de US$ 469,82 bilhões (cerca de R$ 2,13 trilhões) em 2021, mais do que a metade do orçamento militar dos Estados Unidos. Jeff Bezos, ex-diretor executivo da companhia, é a segunda pessoa mais rica do mundo, tendo lucrado milhões às custas do trabalho dos funcionários dos depósitos da Amazon, suprimindo seus direitos e remunerações.

O JFK8 já foi, por algumas vezes, o depósito mais lucrativo de todos em solo estadunidense, enquanto seus trabalhadores não ganhavam o suficiente para sobreviver. A Amazon tem usado todas as suas reservas para acumular lucros para poucos e esmagar os esforços de quaisquer trabalhadores que considere uma ameaça.

Em 2021, a Amazon não repassou US$ 5,2 bilhões (R$ 24 bilhões) em impostos federais corporativos, que deveriam ser considerados dinheiro roubado dos trabalhadores.

A empresa também mantem contrato com as Forças Militares Israelenses, fornecendo drones que são usados para atacar palestinos na fronteira. Segundo matéria publicada pela revista estadunidense The Nation, “desde 2015, a Israel Aerospace Industries (IAI), empresa estatal aeroespacial israelense, também fabricante de armamentos, atende à frota de aviões de carga da Amazon e representa agora 80% das aeronaves da companhia. A IAI é fornecedora do exército israelense e está na vanguarda de experimentos com ‘robôs-atiradores’ autônomos e drones posicionados ao longo da fronteira de Gaza”.

Carta de Chris Smalls

No dia 24 de março, na iminência da eleição histórica, o Sindicato dos Trabalhadores da Amazon (STA) enviou carta a cada uma das pessoas trabalhando no depósito JFK8: “Para os que não me conhecem, meu nome é Chris Smalls e sou o Presidente Interino do Sindicato dos Trabalhadores da Amazon. Minha ligação com esta empresa é profunda. Durante os últimos sete anos, minha vida tem sido afetada positiva e negativamente pela Amazon. Eu não acordei um dia e, simplesmente, decidi me sindicalizar.”

A carta de Chris Smalls veio após sete anos de luta que resultaram não somente em horas de batalhas legais entre Smalls e a empresa, mas também na perda do emprego e na insistente campanha para manchar a imagem pública do ex-funcionário por meio de comentários racistas.

Muitos trabalhadores acham a Amazon opressiva e comparam o trabalho no depósito com o trabalho sob as mesmas “condições das plantations” [como são chamadas as grandes monoculturas existentes nos EUA até a década de XX e que usavam trabalho escravo].

Eles compartilharam inúmeras histórias sobre não poderem beber água ou ir ao banheiro porque, se atrasassem seu trabalho, seriam severamente penalizados ou demitidos. Eles eram dispensados definitivamente do trabalho ao pedirem folga por emergências médicas ou para acompanhar partos.

Protesto contra Jeff Bezos, dono da Amazon., durante a Black Friday de 2021. “A Black Friday explora as pessoas e o planeta” e “Para a extinção e além // Crime da Amazon” eram algumas das mensagens dos manifestantes / Reprodução/Twitter

Devido a uma política da empresa que proíbe manter o celular consigo durante os turnos, os trabalhadores estão constantemente preocupados sobre não poderem contatar suas famílias caso ocorra uma emergência.

Mesmo com eventos extremos como o desastre causado pela passagem de um tornado em Edwardsville, estado do Illinois, os trabalhadores não sabiam do perigo, pois, por não estarem com seus aparelhos celulares, não leram a notificação. O episódio causou a morte de seis pessoas naquela instalação.

Esses desastres continuaram já que, sem um sindicato para defender os trabalhadores, a empresa não se preocupa com o bem-estar dos seus empregados. As companhias só se preocupam em manter a produção e acumular lucro. Com um sindicado, estes desastres não existirão e os patrões não poderão impedir os trabalhadores de exigirem condições mais seguras para si mesmos enquanto estiverem no trabalho.

A história de repressão sindical da Amazon

Mesmo antes do anúncio de 26 de janeiro sobre o STA estar apto para uma eleição sindical, a Amazon já havia usado toda a sua força para destruir a possibilidade de sucesso. Os trabalhadores reportaram que, diariamente – duas vezes por dia –, ou ao final da semana sindical, eram organizadas reuniões uma vez a cada hora nas quais a empresa sentava os trabalhadores e lhes dizia os efeitos negativos de se filiar ao sindicato. Apresentações em slides eram exibidas afirmando a necessidade de dizer “não” ao sindicato, além das propagandas antissindicais coladas nas paredes do depósito.

Quando um funcionário fazia perguntas consideradas “pró-sindicalização”, o chefe dessas “sessões de informação” pedia ao empregado que se retirasse. Foram contratadas pessoas para reprimir a organização a um custo que ficava entre US$ 2000 e US$ 3500 diários (R$ 9.310 e R$13.966) para espalharem mentiras sobre o sindicato.

Milhões foram gastos pela empresa em propagandas e para enviar representantes corporativos de recursos humanos para falar sobre as “consequências negativas” de se juntar ao sindicato.

A Amazon contratou empresas de pesquisa de opinião e consultoria para destruir os esforços sindicais e disseminar materiais antissindicais. Segundo documentos vistos pela CNBC, a Global Strategy Group, que serviu como parceiro de pesquisa para um super Comitê de Ação Política pró-Biden antes das eleições presidenciais de 2020, trabalha para a Amazon desde pelo menos o final do ano passado, produzindo materiais antissindicais.

Vídeos e material impresso distribuídos pelo Global Strategy Group tentavam desencorajar os empregados de votarem para aderir ao sindicato. Eles utilizaram frases como “Um time trabalhando junto” e “Desempacote isso: saiba os fatos sobre sindicatos”, slogan repetido no site antissindical da Amazon, o unpackjfk8.com. Uma funcionária fantoche do RH, conhecida como “Tammy”, foi vista várias vezes roubando material de campanha da STA. Quando confrontada, ela negou ter quaisquer sentimentos negativos ou intenções para com o sindicato.

Os trabalhadores associados ao sindicato não só foram demitidos como presos pelo Departamento de Polícia de Nova Iorque do lado de fora da entrada do depósito JFK8, numa tentativa de intimidar e parar o sindicato.

Os exemplos mais extremos de assédio envolveram a demissão de Chris Smalls e Daequan Smith em retaliação aos seus esforços de organização. Outros trabalhadores receberam ameaças e cartas de aviso em resposta às suas atividades sindicais.

Após sua demissão em março de 2020, Smalls teve de lidar com a brutal campanha de difamação que sofreu. Executivos da Amazon se referiram a ele usando estereótipos racistas, como “thug” [bandido], e afirmaram falsamente que ele integrava uma gangue.

Solidariedade e esforços para angariar fundos para o Sindicato dos Trabalhadores da Amazon

O principal pilar das atividades do STA é a arrecadação de fundos. Ao todo, o sindicato arrecadou US$ 112 mil (R$ 521 mil) em onze meses por meio de doações. Esse dinheiro foi usado para a fabricação de camisetas, cordões para prender crachás, bottons e outros materiais que a STA distribuiu, além de serviços essenciais como alimentos para os trabalhadores, suporte financeiro, outras formas de ajuda mútua entre os empregados e, claro, muitos panfletos.

O fundo também serviu como uma forma de proteger os trabalhadores ligados à STA que foram presos ou enfrentam batalhas legais. No dia 23 de fevereiro, quando Chris Smalls, Jason Anthony e Brett Daniels – esses dois últimos ainda trabalhando na Amazon – foram acusados de invasão de propriedade, obstrução da administração governamental e resistência à prisão (pelo crime de levar comida para outros trabalhadores), o fundo de solidariedade estava lá para ajudar nas despesas legais e proteger seus direitos como trabalhadores.

O Fundo da STA para Trabalhadores Demitidos ajudou a prover para vários trabalhadores que foram demitidos de seus cargos na Amazon, muitas vezes sem nenhum aviso oficial ou representação do RH.

Campanha por telefone para votar “Sim”

Após o anúncio do registro da STA, em 26 de janeiro, os organizadores tiveram apenas cinco semanas para contatar os trabalhadores e conversar com eles sobre o sindicato. Por meio do Conselho Nacional de Relações Trabalhistas (NLRB, na sigla em inglês), a Amazon foi forçada a liberar todos os nomes de empregados do depósito JFK8, permitindo aos organizadores começar a importante tarefa de entrar em contato com os trabalhadores.

Os responsáveis por fazer os contatos telefônicos escutaram muitas histórias de funcionários que sentiam que a companhia não estava zelando pelos seus [dos trabalhadores] interesses. Algumas pessoas foram previamente demitidas pela Amazon sem qualquer tipo de aviso legal, outros precisavam viajar muitas horas para ir e voltar do depósito.

Alguns trabalhadores descreveram sua hesitação a respeito da sindicalização, afirmando que não sabiam o que o sindicato queria ou não acreditavam que ele poderia alcançar seus objetivos, mas muitos estavam interessados em saber mais sobre. Tudo isso gerou mais confiança dos trabalhadores no sindicato.

Trabalhadores expressam empolgação

No primeiro dia de votação, em 25 de março, uma tenda foi construída no estacionamento do depósito JFK8. Os representantes do NLRB começaram a administrar a votação, com os empregados da Amazon observando cada uma das três mesas, tendo às maãos listas com a relação dos 8 mil trabalhadores do depósito.

Longas filas se formaram enquanto os todos estavam ansiosos para fazer história. Por toda a fila, muitos trabalhadores expressaram empolgação; os votantes podiam ver seus colegas supervisionando o processo, o que assegurou uma votação justa e legítima.

Os trabalhadores ficaram mais ansiosos e se sentiram mais encorajados à medida que a eleição avançava. Alguns dos que estavam receosos em expressar seus pensamentos sobre o sindicato nos últimos meses foram até os organizadores da STA expressar sua solidariedade. Um funcionário exclamou “Nós vamos conseguir! E se eles tentarem mexer com a gente durante as negociações, foda-se, nós vamos atacar!”, e outro afirmou que “se não vencermos, podemos tentar novamente!”.

Próximo passo da sindicalização: depósito LDJ5!

A Amazon tem uma semana para contestar os resultados por meio de pedido de uma audiência pós-eleitoral. Ainda que seja certo que eles farão tudo que puderem para impedir os trabalhadores de manterem seus direitos legais, é improvável que sejam capazes de contestar essa conquista histórica. Uma vez que o sindicato seja certificado, o STA também começará o processo para barganhar um contrato com a empresa.

Há grandes lições aprendidas no depósito JFK8 que estão sendo usadas na organização do LDJ5, a unidade de triagem da Amazon também localizada em Staten Island. Entre os dias 24 e 29 de abril, os trabalhadores da LDJ5 votarão sobre a sindicalização.

Sindicatos de diferentes setores têm vivido um aumento de atividades. Já os proprietários das empresas estão com medo de que elas possam estar ameaçadas. É possível constatar isso não somente na Amazon, mas também em outras corporações multinacionais que se consideravam imunes ao trabalho organizado.

Durante o período pré-eleitoral, muitos sindicatos mostraram seu apoio concreto ao STA. O apoio veio de vários movimentos de trabalhadores, dentre eles a União dos Trabalhadores de Alimentos e Comércios (UFCW, na sigla em inglês), União dos Trabalhadores Metalúrgicos (USW, na sigla em inglês) e Trabalhadores da Comunicação nos Estados Unidos (CWA, na sigla em inglês), que se ofereceram para mobilizar seus membros no suporte ao diálogo com os trabalhadores da Amazon acerca dos benefícios de sindicalizar-se. É provável que haja esforço coletivo contínuo para combater patrões opressores e condições de trabalho opressivas.

Como compartilhado por um trabalhador durante o processo de sindicalização, “A Amazon quer assassinar o caráter libertário de nossa luta. Mas pela graça de Deus a história será feita. As pessoas vão falar, e a Amazon será obrigada a barganhar coletivamente, o que será outra batalha para a qual estaremos prontos. Quase todos os imigrantes com quem conversei concordam que a situação deve mudar, e é por isso que a maioria está apoiando o STA. Pessoalmente, eu acredito que, do ponto de vista econômico de todos os trabalhadores, nós venceremos. Aqueles que estão cientes sobre a melhora de suas condições irão definitivamente votar pelo STA”.

O sindicato continuará a lutar pelos trabalhadores do depósito da Amazon em Staten Island e em outros locais, enquanto simultaneamente oferece experiências para outros sindicatos começarem suas ações. Até a vitória, sempre!

www.brasildefato.com.br/ Ani Toncheva e Jacob Buckner /People´s Dispatch /Este artigo foi originalmente publicado no People’s World.

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