A geladeira dos brasileiros que recebem o auxílio emergencial ficou mais vazia neste ano. O governo reduziu o valor do auxílio mensal, que no ano passado foi de R$ 600 a R$ 1.200, inicialmente, e de R$ 300 a R$ 600 depois. Em 2021, os valores são de R$ 150, R$ 250 ou R$ 375, dependendo da família.
Ao mesmo tempo em que a ajuda encolheu, a cesta básica aumentou, puxada pela inflação dos alimentos durante a pandemia. Em Florianópolis, capital com a cesta mais cara do país em abril, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o custo era de R$ 634,53.
Em São Paulo, que tem a segunda cesta mais cara, o custo subiu 13,43% em 12 meses, chegando a R$ 632,61 em abril.
Patrícia Costa, supervisora de pesquisas do Dieese, diz que o novo auxílio não cobre nem os gastos com alimentação do brasileiro, e a insuficiência fica mais evidente quando despesas como aluguel, conta de água e luz e combustível são consideradas.
“O valor do auxílio é muito baixo, ao passo que nos aproximamos de uma terceira onda. Enquanto a vacina não chega, as pessoas precisam de renda e acabam saindo para trabalhar e se arriscando a ser infectadas pela covid”, afirma.
O UOL visitou supermercados de redes populares na periferia de São Paulo para descobrir o que é possível comprar com cada valor do auxílio. A escolha foi guiada pelos produtos mais baratos e promoções do tipo “pague três, leve quatro”. Veja abaixo o que deu para colocar em cada carrinho.
O que dá para comprar com R$ 150
Alimentos
- 1 pacote de 5 kg de arroz: R$ 17,49
- 2 pacotes de 1 kg de feijão: R$ 4,99 (cada)
- 2 pacotes de 1 kg de açúcar: R$ 2,99 (cada)
- 1 kg de farinha de trigo: R$ 3,09
- 4 litros de leite: R$ 3,29 (cada)
- 1 pacote de 300 g de achocolatado: R$ 3,99
- 1 kg de sal: R$ 1,59
- 2 litros de óleo de soja: R$ 6,89 (cada)
- 1 pacote de 500 g de café: R$ 7,69
- 2 pacotes de 500 g de macarrão: R$ 2,39 (cada)
- 2 pacotes de molho de tomate: R$ 0,89 (cada)
- 1 kg de coxa de frango: R$ 11,99
Higiene pessoal
- 3 cremes dentais: R$ 1,69 (cada)
- 1 pacote com 4 sabonetes: R$ 4,79
- 2 detergentes: R$ 1,79 (cada)
- 2 pacote de 8 rolos de papel higiênico: R$ 6,99 (cada)
- 1 xampu: R$ 8,69
Limpeza
- 1 caixa de 1,6 kg de sabão em pó: R$ 17,89
Total: R$ 149,30
‘Só faço uma refeição por dia, emagreci 6 kg’
Leandro Marcolino, 28, mora sozinho e recebe R$ 150 de auxílio. Gasta R$ 40 no mercado, com arroz, óleo de soja e carne. Não é sempre que consegue comprar feijão. O restante do auxílio vai para diminuir a pilha de contas em atraso.
Morador do Jardim Brasil, na zona norte de São Paulo, ele perdeu o emprego como faz-tudo em uma lanchonete em março de 2020, no início da pandemia.
Leandro diz que faz malabarismo para bancar aluguel, alimentação e pensão alimentícia dos quatro filhos, pegando trabalhos temporários como ajudante de pedreiro.
Preocupado com o preço do gás, na faixa de R$ 90, conta que precisa racionar o uso para o botijão durar pelo menos três meses.
O aluguel de R$ 500 está atrasado há dois meses, e o medo do despejo bate à porta diariamente.
Desde que começou a pandemia, emagreci seis quilos. Só faço uma refeição por dia, o almoço. Pulo a janta, mas se tiver pão, eu como. Se não tiver, eu aguento. É um tempo de decadência, realmente. Queria andar de cabeça erguida, e não envergonhado.
Leandro Marcolino, 28, morador do Jardim Brasil, zona norte de São Paulo
O que dá para comprar com R$ 250
Alimentos
- 2 pacotes de 5 kg de arroz: R$ 19,80 (cada)
- 4 pacotes de 1 kg de feijão: 5,98 (cada)
- 1 pacote de 5 kg de açúcar: R$ 13,99 (oferta)
- 1 kg de sal: R$ 1,59
- 12 litros de leite: R$ 2,98 (cada)
- 4 pacotes de 500 g de café: R$ 6,98 (cada)
- 1 kg de farinha de trigo: R$ 3,49
- 3 litros de óleo de soja: R$ 6,79 (cada)
- 4 pacotes de macarrão: 2,29 (cada)
- 4 pacotes de molho de tomate: R$ 1,68 (cada)
- 2 achocolatados de 300 g: R$ 3,99 (cada)
Higiene pessoal
- 6 cremes dentais: R$ 1,59 (cada)
- 5 sabonetes: R$ 1,19 (cada)
- 1 xampu: R$ 7,79
- 1 pacote de papel higiênico: R$ 10,99
Limpeza
- 2 kg de sabão em pó: R$ 18,49
- 5 detergentes de R$ 500 ml: R$ 1,29 (cada)
Total: R$ 249,71
Xampu e pasta de dente são ‘luxo’
Lucimara Pedrosa, 42, recebe o auxílio de R$ 250, pago a famílias com mais de uma pessoa e que não são sustentadas só por uma mulher. Com quatro filhos, a autônoma do Jardim Guarani, na zona norte de São Paulo, está desempregada desde o início da pandemia e depende do auxílio emergencial para sobreviver.
Ela reserva pouco mais da metade dos R$ 250 para comprar arroz, feijão e leite. Produtos de higiene pessoal, como xampu e pasta de dente, acabam sendo um “luxo”, segundo ela. A prioridade é comida na mesa.
Se a carne está mais cara, a alternativa é recorrer às hortaliças e ir ao mercado em dia de promoção.
Mensalmente, ela também recebe cestas básicas da prefeitura. Vez ou outra, consegue um bico como faxineira para ter um dinheiro a mais no fim do mês, mas não consegue evitar o atraso de algumas contas. A sorte da família, diz, é ter casa própria, senão o despejo seria um risco.
Espero chegar o dia das promoções, como segunda-feira, que é dia dos legumes e das verduras mais baratos. Quarta é dia do leite e sexta é da ‘mistura’ [carne]. Tudo que eu queria era um trabalho com registro em carteira e perto de casa para eu não ter que pagar condução. Eu sei que é difícil, mas vejo histórias inspiradoras de pessoas que se formaram na faculdade com 70, 80 anos e me animo. Quem sabe um dia eu consiga esse emprego.
O que dá para comprar com R$ 375
‘Faço frango para o meu filho e como ovo’
Na casa de Isabel Estradiote, 33, a geladeira virou quase um item de decoração. No dia em que conversou com a reportagem, ela tinha no eletrodoméstico apenas feijão e carne moída congelados. Isabel recebe R$ 375 mensais, porque sustenta a família sozinha.
Como o dinheiro é escasso, a operadora de telemarketing desempregada procura constantemente ONGs que doam cestas básicas. Ela vive com o filho de três anos na casa de uma parente no Jardim Iguatemi, zona leste da capital.
Isabel gasta mais de R$ 150 só com fralda e leite. O menino voltou a frequentar a creche, mesmo com a insegurança que a mãe sente na pandemia.
Antes do coronavírus, Isabel diz que usava o tempo livre, quando não estava cuidando do filho, para trabalhar no mercadinho do bairro ou fazer faxina. Agora nem isso é possível.
Se tenho frango na geladeira, faço para meu filho comer e fico com ovo. Eu me privo de comer fruta para ele se alimentar. Tenho que viver fazendo contas no papel, senão não dá. Nunca pensei que iria viver assim.
Isabel Estradiote, 33, moradora do Jardim Iguatemi, na zona leste de São Paulo
Alimentos
- 2 pacotes com 5 kg de arroz: R$ 19,99 (cada)
- 4 pacotes com 1 kg de feijão: R$ 6,49 (cada)
4 unidades de óleo de soja: R$ 6,84 (cada)- 1 kg de farinha de trigo: R$ 3,69
- 5 pacotes com 1 kg açúcar: R$ 2,69 (cada)
- 1 kg de sal: R$ 2,19
- 12 litros de leite: 3,47 (cada)
- 4 pacotes de 500 kg de café: R$ 8,99 (cada)
- 1 unidade de achocolatado: R$ 8,29
- 3 pacotes de bolacha: R$ 1,45 (cada)
- 5 pacotes de macarrão: 2,29 (cada)
- 5 molhos de tomate: R$ 1,09 (cada)
- 1 embalagem com 500 g de margarina: R$ 4,59
- 2 bandejas de ovo com 12 unidades: R$ 5,99 (cada)
- 2 kg de sobrecoxa: R$ 12,99 (cada)
Higiene pessoal
- 6 unidades de creme dental: R$ 1,79 (cada)
- 6 unidades de sabonete:1,59 (cada)
- 2 pacote com 15 rolos de papel higiênico: R$ 17,39 (cada)
- 1 pote de xampu: R$ 19,69
- 1 pote de condicionador: R$ 10,49
Limpeza
- 5 unidades de detergente: R$ 1,79 (cada)
- 1 caixa de 1,6 kg de sabão em pó: R$ 17,99
Total: 374,50
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