Valor mais alto pago por litro encontrado no Acre é superior à média nacional, de R$ 5,45 por litro. Especialista explica os motivos e reafirma que o governo poderia intervir para praticar preços justos a todos
Como na época da hiperinflação no Brasil, na década de 1980, quando a inflação chegou a 80%, atualmente, os brasileiros vão dormir esperando um novo reajuste nos preços dos combustíveis no dia seguinte. Em alguns estados, como o Acre, o susto no dia seguinte é enorme. Tem cidades acreanas, como Marechal Taumaturgo, cidade próxima a fronteiro do Brasil com o Peru, onde o litro da gasolina está custando R$ 8,20.
O valor mais alto encontrado pelos dirigentes da CUT, que ajudaram a fazer uma pesquisa nacional informal, não consta nem da pesquisa semanal de preços de combustíveis da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
De acordo com a pesquisa da ANP, o maior preço encontrado no país, na última semana, foi em Cruzeiro do Sul, também no Acre, onde o litro do combustível foi vendido a R$ 6,70.
Esses preços são resultados dos aumentos periódicos determinados pela Petrobras. Só este ano, a petroleira já aumentou a gasolina seis vezes e o diesel, cinco. O último anúncio de reajuste dos combustíveis na segunda-feira (8). A cada 15 dias, em média, a Petrobras anuncia um novo aumento nos preços. Só este ano, gasolina já acumulou um aumento de 54,3%. No mesmo período, o diesel subiu 41,5%.
Mas, como não estamos em períodos de hiperinflação, apesar da carestia que vem aumentando, os brasileiros já sabem que os preços dos combustíveis estão abusivos e impactam nos preços de todos os outros produtos. O resultado é que o salário consegue comprar cada vez menos e até o básico os trabalhadores e as trabalhadoras estão sendo obrigados a cortar da lista de compras mensais.
A média de preços da gasolina em outras regiões do país é de R$ 5,45. Mas em algumas cidades como Juiz de Fora (MG), Formosa (GO), Alenquer (PA) e Bagé (RS), o preço já bate a marca dos R$ 6,00. É o caso também do Rio de Janeiro. Na capital do estado, o litro da gasolina chegou a custar R$ 6,19. Porém, em Barra Mansa, de acordo coma ANP, o litro foi vendido a R$ 6,49.
Por que ainda mais caro em algumas regiões?
A explicação para o preço ainda mais alto nesses locais, de acordo com Valnisio Hoffman, Coordenador do Sindicato dos Petroleiros do Espírito Santos (Sindipetro-ES), está em dois fatores, um deles a tributação que varia de estado para estado. “Tem locais em que o ICMS é maior, pode chegar até 34% enquanto em outros, é de 25% e isso interfere no preço”, ele explica.
Outro motivo é a logística empregada para que o combustível chegue a essas localidades. “A distância encarece os custos e ainda vai depender o tipo de transporte utilizado, se é a balsa, caminhão ou trem. Tudo entra no cálculo”.
Mas, de acordo com ele, os preços podem ainda ser impactados pela formação de carteis de postos de combustíveis. Há locais em que todos os postos pertencem a um mesmo dono e há locais onde eles se reúnem para combinar um preço mínimo para impor à sociedade.
Sem ter para onde correr, consumidor então é obrigado a pagar pelo preço pedido.
Os impactos para a população, em especial nessas regiões, são maiores porque além de o preço dos combustíveis estar acima da média nacional, a média salarial dos trabalhadores também é menor.
“Onde os preços dos combustíveis, geralmente, são mais caros, o PIB também é menor. São locais onde o há poucas atividades produtivas, por isso os salários são menores e no fim das contas, pagando mais caro pelos combustíveis e pelos outros produtos que ficam também mais caros, o custo de vida fica maior”, diz Valnísio.
A técnica do Dieese, Adriana Marcolino, explica que toda vez que aumenta o preço dos combustíveis, há impacto nos preços de outros produtos, principalmente os alimentos.
Alta nos combustíveis come parte da renda pessoas, reduz o poder aquisitivo e pressiona outros preços porque o transporte é item presente em toda a cadeira de produção. Tem impacto nos alimentos, nos remédios, vestuário, enfim, em tudo o que compõe o orçamento familiar
Preço justo é possível
Para Valnisio Hoffmann, o mínimo que um governo voltado para o social faria nestes casos seria subsidiar o preço dos combustíveis para que fossem justos ou no mesmo patamar de outras regiões.
“A Petrobras tem uma função social por ser uma estatal. Mas infelizmente os acionistas só pensam em lucros e atitudes assim não são pensadas. Eles, atualmente, rasgam o estatuto e a função social da empresa”.
Hoffman diz ainda que um caminho para viabilizar o subsídio para regiões mais distantes dos centros produtores é a mudança na política de preços da Petrobras, que acompanha a variação do dólar e do mercado internacional.
“Não se justifica essa política”, ele diz. O dirigente explica que o custo de extração no Brasil é relativamente baixo se comparado a outros países. E que o Brasil pode aumentar a capacidade de refino se ampliar seu parque. “Se usarmos as refinarias de forma correta, não torná-las ociosas, não vendê-las, poderemos ser autossuficientes em refino e não depender de importação”, diz Valnisio Hoffmann.
Temos que parar o desmonte e a venda da Petrobras. Precisamos de investimentos e não de privatizações. Veja o que aconteceu com a Liquigás que foi privatizada com governo prometendo gás mais barato e o que aconteceu foi o contrário
De acordo com dados da ANP, levantados pelo Dieese, a produção nacional de petróleo cresceu 18% nos últimos cinco anos (2016 a 2020) e chegou a 3,7 milhões de barris equivalentes por dia. Além disso, os custos de produção de petróleo e refinados no país tem caído em razão dos ganhos de eficiência da empresa.
Desgoverno
Para Edmar Batistella, presidente da CUT Acre, estado onde são praticados os maiores preços do país, além da urgente mudança na política de preços da Petrobras, para derrubar os preços dos combustíveis, tem que cair também o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL)
Para o dirigente, a população, que já está perdendo o direito ao transporte de carro, está perdendo também o direito de cozinhar e comer já que o gás de cozinha também aumentou e milhçoes de brasileiros estão com dificuldades para comprar comida.
Enquanto continuarmos com esse desgoverno, quem vai pagar, quem vai sofrer é a população, principalmente a mais carente que já não tem o que comer
Diminuir imposto não resolve
Para corroborar a urgência na revisão da política de preços da Petrobras, em nota técnica, o Dieese, afirma que uma redução dos preços dos combustíveis por meio de diminuição de impostos implica, necessariamente, em renúncia fiscal e nas circunstâncias atuais, em que o país precisa aumentar a arrecadação para fortalecer o sistema público de saúde, essa solução compromete mais ainda a capacidade do Estado brasileiro.
“Cortes na Cide (Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico), no PIS/Cofins ou no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) são medidas paliativas, se não houver mudança na política do setor de petróleo no Brasil que transforme, de forma mais estrutural, a formação dos preços. É um custo que novamente será pago pelo conjunto da população”, diz trecho da nota.
Política de preços da Petrobras
Logo após o golpe de 2016, o governo de Michel Temer (MDB), adotou a PPI (Preço de Paridade de Importação), política mantida por Bolsonaro, que faz com que os combustíveis sejam reajustados pela variação do mercado global, o que favorece apenas os acionistas da Petrobras, encarecendo os combustíveis e todos os produtos que dependem do transporte rodoviário.
Diferente dos tempos dos governos Lula e Dilma, quando a variação dos preços dos combustíveis seguia um cálculo baseado em vários fatores e que possibilitava um controle maior dos preços, a atual gestão da Petrobras insiste em manter a PPI, que é a política responsável pelos constantes reajustes nos preços.
A Petrobras, quando Sérgio Gabrielli presidiu a estatal, durante o governo Lula, considerava a organização do mercado, a distribuição, a demanda por importação e as particularidades do mercado interno, como oferta e procura, e concorrência entre distribuidoras. A variação cambial e o preço internacional também eram considerados, mas não eram determinantes.
www.cut.org.br / Andre Accarini