36,8 milhões receberam resposta negativa ao pedido do auxílio de R$ 600,00. Para a ex-ministra Tereza Campello e para secretária da CUT, Jandyra Uehara, decisão de Bolsonaro em negar pagamento é deliberada
Enquanto 73.242 militares da ativa, da reserva, pensionistas e anistiados ligados ao ministério da Defesa, receberam ilegalmente R$ 43,9 milhões de auxílio emergencial, outros 36,8 milhões de brasileiros, trabalhadores informais, autônomos e microempreendedores individuais pobres, sem renda, tiveram seus pedidos negados pelo governo de Jair Bolsonaro e não receberam os R$ 600,00 previstos para serem pagos durante três meses. A ajuda financeira durante a pandemia do coronavírus (Covid 19) foi aprovada pelo Congresso Nacional em março, assim que começaram as medidas de isolamento social para conter a disseminação da doença.
O alto número de pedidos negados chamou a atenção de especialistas em políticas públicas e procuradores da República que, com base em informações fornecidas pelo governo à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) do Ministério Público, mapearam esses pedidos, segundo a agência de notícias BBC.
Até agora, o Ministério da Cidadania, comandado pelo ministro Onyx Lorenzoni, negou os pedidos de auxílio de quem perdeu o emprego depois de 16 de março deste ano, e para cerca de 40 mil pessoas que têm familiares presos, apesar delas terem esse direito.
O mesmo aconteceu com pessoas candidatas ou eleitas como suplentes de vereador nas últimas eleições municipais, em 2016. Ou seja, mesmo que estejam desempregadas e não tenham assumido nenhum cargo eletivo, o governo, ao cruzar os dados com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), decidiu negar o auxílio. Nenhuma das situações acima está prevista na lei que criou o auxílio emergencial e, por isso, o governo, ao negar os R$ 600,00 comete uma ilegalidade, acredita a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello.
Outra ilegalidade, que não foi por acaso, de acordo com ela, é o fato de mais de 4% dos integrantes das Forças Armadas terem recebido o auxílio emergencial. O pagamento, inclusive para familiares de militares, foi orientado, porque “a coisa mais fácil do mundo é fazer um cruzamento com a própria folha de pagamentos do governo federal”, diz Tereza.
“O controle é automático. É muito mais fácil cruzar uma lista de servidores do próprio governo do que uma lista com o Tribunal Eleitoral. A suspeição é clara de que houve orientação neste sentido. São milhares de militares atendidos pelo auxílio. É muita gente para ter sido apenas um erro. E eles só vão devolver o dinheiro porque foram descobertos”, diz a ex-ministra, como conhecedora do funcionamento da máquina governamental.
Campello também critica o que chama de ato discricionário e preconceituoso, o fato do governo tomar uma decisão que não consta na lei, como negar o pedido de auxílio a milhares de familiares de pessoas presas. Segundo ela, é uma clara discriminação de direitos humanos, já que é justamente por ter uma pessoa presa que a família fica mais exposta e vulnerável.
“Ao mesmo tempo em que libera o auxílio para milhares de militares, o governo nega o auxílio a parentes de presos ao arrepio da lei, porque o único critério para receber é a renda. Ou a pessoa tem direito ou não. Este governo é simplesmente preconceituoso”, diz.
A lei que instituiu o auxílio emergencial prevê que a renda familiar deverá ser de meio salário mínimo (R$ 552,50) até três salários (R$ 3.135,00) ou rendimento bruto anual de até R$ 28.559,70.
De acordo com a ex-ministra do governo Dilma Rousseff, se quisesse, Bolsonaro poderia ter pago na primeira semana os beneficiários do Bolsa Família, que é um grupo já conhecido pelo governo, e não demorar quase um mês para efetuar o pagamento, como ocorreu.
“Uma coisa é tomar medidas para evitar fraudes, outra é demorar três semanas para reconhecer o direito, de quem o governo já conhece”, diz.
Política genocida de Bolsonaro
A ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome classifica a atitude do governo, ao negar pedidos de auxílio emergencial, como preconceituoso e genocida. Para ela, Bolsonaro age de forma deliberada para provocar o caos social e levar as pessoas às ruas e assim pôr um fim ao isolamento.
“Não é possível que só incompetência explique o que está acontecendo. As informações desencontradas, a falta de transparência, de coordenação, a não tomada de decisões simples e elementares, como organizar filas nas agências bancárias e promover mecanismos de proteção, são formas deste governo provocar o fim do isolamento social”, diz a ex-ministra.
Bolsonaro quer que as pessoas saiam de casa, se aglomerem, sem nenhum mecanismo de proteção. Ele é genocida
A classificação de Jair Bolsonaro como genocida é compartilhada pela secretária de Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara. Ela lembra que desde o início quando se falou em auxílio emergencial, o governo queria pagar apenas R$ 200,00 e graças à pressão da CUT e de partidos progressistas, o valor foi fixado em R$ 600,00. Essa grande diferença de valores demonstra o conjunto da postura deste governo, acredita a dirigente.
“Esse governo não tem compromisso com a garantia do mínimo necessário, para que as pessoas em situação de vulnerabilidade possam passar pelo período da pandemia. Dificultar o acesso de familiares de presos, de desempregados e candidatos a cargos eleitorais, é só mais uma parte da política genocida deste governo”, afirma Uehara.
Negar o auxílio a quem precisa, não dar garantias para que as pessoas fiquem em isolamento social são atos que compõem a política genocida e de exclusão social do governo Bolsonaro
A ex-ministra Tereza Campello também é uma forte crítica à política de fim do isolamento social. Segundo ela, Bolsonaro quer que mais pessoas sejam infectadas, e na teoria dele, fiquem imunes ao coronavírus, independente do número de mortes que isso possa causar.
“Essa política de anticorpos, de “imunidade do rebanho”, só funciona em casos em que a população é vacinada. Se 70% forem vacinadas, forma uma cobertura que evita uma onda gigante de contaminação. Se não tem vacina, haverá essa onda de contaminação e mortes. É levar as pessoas ao matadouro”, alerta Campello.
A falta de coordenação do governo federal com estados, municípios, com os médicos e agentes de saúde, que fazem parte da rede que conhece a particularidade de cada cidade, de cada bairro, demonstra também que Bolsonaro quer que as pessoas saiam às ruas.
“É um governo que age contra a ciência, numa politica criminosa, deliberada para criar caos social. Quando Bolsonaro convoca as pessoas a saírem às ruas, ele aposta no desespero das famílias, na insegurança, no caos, no quanto pior, melhor”, avalia Tereza Campello.
www.cut.org.br / Rosely Rocha